segunda-feira, 19 de julho de 2010

Livre para viver, livre para rodar

Escapar. É uma palavra que as pessoas usam o tempo todo para descrever a experiência de pilotar uma motocicleta, especialmente uma Harley-Davidson.


A palavra em questão pode significar coisas diferentes para pessoas diferentes, uma vez que cada pessoa possui algo que a escraviza. Mas, o que quer que seja, passar um tempo em cima de nossa motocicleta pode nos libertar – por uma hora, alguns dias, ou mais tempo.


Para mim e dois amigos engenheiros da defesa civil, Marc Gonsalves e Keith Stansell, a palavra escapar ganhou um significado bem mais literal, quando nosso avião caiu no meio da floresta colombiana em 13 de Fevereiro de 2003. Nós sobrevivemos à queda, mas fomos imediatamente capturados por membros do grupo terrorista mais famoso daquele país. Nós não veríamos a liberdade novamente por 1.967 dias – quase cinco anos e meio.


É difícil descrever o que passamos – e as condições que fomos forçados a viver (apesar que as detalhamos no livro que escrevemos, “Fora do Cativeiro”). Basta dizer que as palavras “inferno na terra” não são suficientes para explicar. E nós sabíamos que os sequestradores tinham ordens para matar todos os prisioneiros que tentassem escapar ou em caso de tentativa de resgate, o que nos deixou pouco espaço para a esperança de um dia vermos a liberdade novamente.


Nessas circunstâncias, uma das melhores coisas que tínhamos era nossa imaginação. Então, nós começamos a sonhar sobre uma viagem de moto, a “Viagem da Liberdade”. Quando estávamos imersos nesses pensamentos, não nos sentíamos como prisioneiros, conforme descrito em nosso livro:


Com o passar do tempo, nossa esperança de liberdade estava desaparecendo e nós elaborávamos cada vez mais a “Viagem da Liberdade” em nossas mentes. Nada de motos baratas, iríamos pegar umas Harleys semi-novas e fazer um tour pelo sudeste dos Estados Unidos. Quanto mais nossas privações aumentavam, nós precisávamos de sonhos maiores para combatê-las, nós sonhávamos em entrar em uma revenda da Harley-Davidson, contar nossa história de sequestro e ganhar um belo desconto em três Harleys zero quilometro. Então, pegaríamos a Estrada para rodar de costa a costa.


Mesmo quando parávamos para um descanso de cinco minutos (em marchas forçadas) e sentíamos que nosso espírito estava por demais enfraquecido, algum de nós diria algo como “Eu ouvi a respeito de uma Estrada no Tennessee. Chamada de “Rabo do Dragão”. Trezentos e dezoito curvas em apenas 11 milhas. Nós vamos rodar por lá.” Minha mente passava o resto da marcha naquela estrada, sonhava em fazer cada uma daquelas curvas.


Em 2 de Julho de 2008, graças à uma precisa e audaciosa operação de resgate conduzida pelo exército colombiano, a liberdade sorriu para nós. Após voltarmos para casa, aconteceu um redemoinho em nossas vidas. Fomos reunidos aos nossos familiares, demos entrevistas, e iniciamos um longo processo de reajuste à vida “fora do cativeiro”. Graças à Harley-Davidson, essa última parte se tornou um pouco mais fácil.


Após uma entrevista que concedemos à CNN, a “Motor Company” tomou conhecimento de nossa história e de nossos sonhos de uma “Viagem da Liberdade”. Naquele verão, eles nos convidaram para participar do aniversário de 105 anos da Harley-Davidson em Milwaukee e lá eles disseram que cada um de nós poderia escolher uma motocicleta nova de presente. Após eu me recobrar do choque, escolhi uma Road King comemorativa dos 105 anos (obrigado, Harley-Davidson).


Durante meu tempo sequestrado, minha vida virou de pernas para o ar, que estou até hoje tentando consertar. Meu casamento não sobreviveu. Ainda estou me ajustando à vida “civil”. E estou trabalhando duro para reconstruir o relacionamento especial que sempre tive com meu filho Tommy, que tinha apenas cinco anos quando fui capturado.


Para passar por tudo isso, conforme escrevi no livro, minha motocicleta Harley foi perfeita para tirar o estresse:


Sempre que possível, eu pego minha nova motocicleta e vou tomar café da manhã em uma padaria chamada Osorio. Não há nada de mais no local, mas ser capaz de sair e tomar uma xícara de café em um copo descartável, só porque eu quero, é prazer suficiente.


O passeio de volta para casa, sentindo o ar morno, é sempre refrescante, mas nada é mais gratificante do que chegar na rua onde moro.


Liberdade. Esta é outra palavra que pode significar coisas diferentes. Para os centenas que ainda estão sequestrados pela FARC, é apenas um sonho, mas não podemos esquecê-los. Para mim e aos demais que sobreviveram ao cativeiro, significa voltar para casa. Para você, espero que sempre signifique poder escapar com sua motocicleta Harley-Davidson, sempre que quiser.


Tom Howes, junto com Marc Gonsalves e Keith Stansell, é co-autor de “Out of Capitivity”: Surviving 1.967 Days in the Colombian Jungle”. Hoje em dia, vive em Merritt Island, na Florida, junto com seu filho Tommy.


Trecho extraído da revista Americana HOG, sexta edição, sessão Exhaust.

Um comentário:

Vera Felippetto disse...

História muito bonita... É... só quando perdemos algo é que descobrimos o quanto aquilo era importante e crucial na nossa vida.
Welcome to life, again!!!